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2012-07-02

A Catedral do Mar ... (Santa Maria Del Mar, Barcelona – A Catedral do Povo)

Um livro de excepção
a não perder …



     
      A Catedral do Mar (de Ildefonso Falcones, 2006) é um fabuloso romance histórico cuja leitura nos transporta, de uma maneira intensa, à Barcelona do século XIV pelo magnífico retrato que dá das vivências desta cidade nos fins da Idade Média, assim como da sociedade da Barcelona medieval no seu conjunto.

Barcelona, Santa Maria Del Mar.
     Na sua narração perpassa o burburinho das ruas, as cores pardas e os cheiros a suor do povo simples que transporta nos ombros as pedras para a edificação da uma das mais belas catedrais góticas da Catalunha: Santa Maria Del MarA Catedral do Povo. Foi edificada num período ininterrupto de 55 anos por Berenguer de Montagut, o maior arquitecto catalão daquela época.
   O esforço aqui descrito é uma epopeia de heroísmo e de sacrifício humano, o qual só foi possível pela perseverança da fé de todos os que, para a sua concretização, superaram dificuldades inacreditáveis.

     São várias estórias, dentro da História, passadas entre 1320 e 1384, onde a figura central Arnau Estanyol, filho de Bernat Estanyol e Francesca, gente de origem rural que se consegue libertar do jugo de um Senhor Feudal que exerce sobre Francesca o Direito da Primeira Noite (jus primae noctis). 
Barcelona, Santa Maria Del Mar.
      O nosso herói (Bernat) refugia-se em Barcelona, cidade onde a Lei lhe permitia a conquista da liberdade ao fim de uma ano de trabalho. Aí vai começar por exercer a profissão de oleiro, enquanto o filho (Arnau), de criança pobre e curiosa, vai-se transformar num homem de sucesso ligando a sua vida à construção da Igreja de Santa Maria del Mar inaugurada a 15-VIII-1383. 
    Ao longo de toda a narração percorrem-se vários caminhos que nos descrevem um mundo de opressão, medo, fome; assim como nos mostra o caminho da redenção individual, apesar de todas as contrariedades.

Um livro a não perder.

Boa leitura.

2011-11-26

Património edificado em Lisboa

Av. Estados Unidos da América, Lisboa.
Três imóveis e respectivas decorações murais surrealistas
com interesse patrimonial.


Av. Estados Unidos da América, Lisboa.

     Foi na Avenida dos Estados Unidos da América, em Lisboa, que surgiu pela primeira vez em Portugal um urbanismo que contrariava o tradicional conceito da rua-corredor, com a implantação de edifícios de dimensões inabituais e dispostos perpendicularmente ao eixo da via de rodagem, tipo de urbanização que logo foi reproduzida em parte da Av. Infante Santo.

  Grande número destes edifícios tem a assinatura dos arquitectos que se distinguiram no 1.º Congresso Nacional de Arquitectura (1948), o qual representou uma viragem na reconquista da liberdade de expressão arquitectónica e da "construção multifamiliar em altura" e em grande escala, à revelia da corrente mais conservadora do Estado Novo que se vinha opondo a esta transformação.

  A oposição ao surgimento desta nova tipologia arquitectónica ficou a dever-se ao facto de se considerar que as tradicionais construções unifamiliares à "antiga portuguesa", inseridas dentro de uma “ideologia ruralista” e receosa da colectivização habitacional, tinham a vantagem de serem mais adequadas ao recato da vida familiar, contra as “desvantagens sanitárias e morais dos prédios”, como defendia o arquitecto Manuel Vicente Moreira em 1950, num estudo sobre a problemática habitacional.

  Esta Avenida foi um marco inovador que viria a alterar os conceitos urbanísticos que nas décadas seguintes influenciaram decisivamente o urbanismo na cidade de Lisboa.

  Como consequência do triunfo destas novas ideias, edificaram-se em ambos os lados desta avenida grandes prédios em banda, cada banda com três edifícios independentes mas justapostos.

Azulejos de padrão.
Azulejos de padrão.














   Três destes prédios são presumivelmente os mais antigos e estão situados no quarteirão que fica entre a Av. de Roma e a Av. Rio de Janeiro.
   Foram projectados para receberem luz solar e arejamento de todos os lados e para esse efeito foram separados por amplos espaços ajardinados, segundo um projecto do notável arquitecto paisagista David Ribeiro Teles (n. 1922), o qual só foi aplicado ao lado Norte deste novo eixo viário. O lado Sul do mesmo, edificado pouco mais de uma década depois, sucumbiu às pressões especulativas e trocou os ajardinados por baixas edificações destinadas a uso comercial e industrial o que acabou por desvirtuar o projecto inicial de Ribeiro Teles.
   Estes três edifícios que supomos serem os iniciais(?) foram edificados por volta do ano de 1959, e neles foi implantado um relevante conjunto de 6 painéis decorativos de mosaico em pastilhas de vidro que eram então fabricadas na «Covina – Companhia Vidreira Nacional», tendo ainda alguns revestimentos de azulejos de padrão com formas geometrizadas, os quais foram produzidos na «Fábrica de Cerâmica da Viúva Lamego», a qual ainda conserva as respectivas matrizes em serigrafia, assim como as referências das suas cores originais.

Mosaico
Mosaico












Mosaico
Mosaico










Mosaico
Mosaico












 Este conjunto de edificações encontra-se vandalizada pela praga das marquises que lamentavelmente vem assolando a cidade de Lisboa, assim como pelas diversas pequenas alterações nas fachadas, como a abertura de frestas e janelas onde nunca estiveram previstas, pelos aparelhos de ar condicionado dispostos arbitrariamente, assim como pela passagem de diversas canalizações pelo lado exterior a nível do rés-do-chão para evitar maiores despesas: tudo isto resultado da falta de sensibilidade, de cultura estética e de respeito pelas normas em vigor; o que, a continuar assim, irá transformar esta outrora nobre avenida numa espécie de periferia de uma qualquer capital de um país subdesenvolvido.

  Não faz muito tempo, numa reunião de condomínio em que se discutia a necessidade de obras de conservação num destes prédios, um bisonho co-proprietário que obstaculizava as necessárias obras de limpeza das fachadas argumentou que o prédio “era como as mulheres”, pois, tal como elas “não era por se pintarem que viriam a gozar de mais saúde”!… Com este tipo de atitudes cada vez mais frequentes, poderemos imaginar o que o destino reservará a este notável património arquitectónico!...

  Alguns azulejos deste conjunto de prédios já foram arrancados em obras recentes; outros foram substituídos por reboco ou por reproduções de má qualidade que não respeitam os tons originais, o que seria muito fácil caso recorressem à fábrica que os produziu.

Mosaico, assinado
«CC» - Carlos Calvet.
Assinatura de Carlos Calvet
numa pintura sua.








   Quanto aos 6 grandes painéis decorativos em mosaico (2 por cada conjunto de 3 prédios) que decoram estas fachadas nos topos Norte e Sul, a nível do piso térreo, junto às colunas que sustentam as edificações, são talvez a primeira manifestação da então “subversiva” modernidade a nível das artes plásticas urbanas.

  Segundo conseguimos investigar, deve-se a autoria destes 6 painéis a Carlos Calvet (1928-2014), que coloca a sua assinatura «CC» no painel que está junto à entrada do n.º 60 desta avenida, cuja temática revela um sentido visionário de cariz surrealista, por influência, segundo supomos, do seu cunhado o artista plástico António Areal (n. 1934), com o qual colaborava por esta altura.
  
  Estes painéis são uma afirmação da modernidade a nível das artes plásticas que, pela primeira vez (?), nesta proposta “salta” para a rua, a nível do espaço público lisboeta – e talvez de todo o país –, depois de alguns anos confinada apenas ao domínio quase privado de um ou outro salão oficial.


CARLOS CALVET DA COSTA (1928-2014)

 
Carlos Calvet (1928-2014)
Artista plástico português, Carlos Calvet nasceu em Lisboa em 1928 e aqui veio a falecer em 2014. Licenciou se em Arquitectura na Escola de Belas Artes do Porto. Dedicou-se desde muito cedo à pintura e nos anos 40 constituiu o grupo «Os Surrealistas» juntamente com Mário Cesariny, Pedro Oom, Henrique Risques Pereira, António Maria Lisboa, Mário Henriques Leiria, Fernando José Francisco, Fernando Alves dos Santos e Cruzeiro Seixas.


  Além da pintura e da arquitectura, Calvet interessou-se também pelo cinema, tendo realizado algumas curtas-metragens, uma das quais com a participação do poeta surrealista Mário Cesariny. Expôs pela primeira vez, em 1947 na 2ª Exposição Geral de Artes Plásticas na Sociedade Nacional de Belas Artes, obras que começavam a revelar um sentido de modernidade marcado pelo cubismo estético de Braque e valorizando o estatismo dos objectos representados.
  Entre 1948 e 1950 faz a sua primeira viagem a Paris. A partir de então, consciente da sua vocação como pintor, Calvet passa a estar mais atento à construção, ao jogo de volumes e à ambiguidade entre o simbolismo e a imagem natural. Nestas ambiguidades revela se a tendência para tudo petrificar. Em algumas paisagens aparecem ondas do mar e nuvens representadas como se fossem sólidos geométricos. Depois de um período abstracto lírico (1963 1964), Calvet confronta as formas espontâneas com as geométricas (1964 1965).

Com a redefinição do espaço, voltou-lhe a necessidade de figuração de objectos inventados no próprio acto de execução. Primeiro, manchas informes que adquiriam presença insólita de objectos inidentificáveis; depois, passaram a ser objectos banais, parafusos, botões, caixas de fósforos, ladeados de decorativismos de gosto pop. O ano de 1966 marca o início da síntese "pop metafísica" que caracteriza toda a sua obra posterior. Realizou exposições nas mais diversas cidades internacionais como Tóquio, Paris, São Paulo, Chicago, Roma, Montreal, Frankfurt ou Madrid.
(Fonte: Carlos Calvet. In Infopédia Porto: Porto Editora, 2003-2011)


  Aqui deixamos esta chamada de atenção à Câmara Municipal de Lisboa para a necessidade da salvaguarda deste conjunto patrimonial (3 imóveis e respectivas decorações murais), pois consideramos ser um monumento inseparável da história do urbanismo e da arte da cidade.

  Para este efeito o Município deve tomar as medidas jurídicas e administrativas necessárias ao seu arrolamento e classificação como património municipal, como lhe compete, único meio de evitar a sua degradação pelo decurso do tempo e a incúria dos seus legítimos proprietários, assegurando a obrigatoriedade da sua sobrevivência e conservação, tendo por base a Lei n.º 13/85 de 6 de Julho, e a subsequente Lei n.º 107/2001 de 8 de Setembro, sobre o Património Cultural Português.

2010-04-13

Pátria

No sangue que nos flui
secretamente
do coração
está a força que nos une
a um povo
disperso
e longe desta pátria

Aqui estamos pois
neste desgosto
ao leme
do rumo certo
que te liberta enfim
querida Pátria.


J.T. - 23-Abr-73

Rumo

Avançar cada vez mais
sem hesitações.
Comunicar a todos a verdade
que se esconde.
Dizer não às traições
vencer barreiras.

Sonhar!
Sonhar num amanhã:
Livre
       sem guerras
               sem fronteiras ...


J.T. - 22-Abr-73



na minha esperança clandestina
houve sonhos esmagados num isntante
e lábios
súbito oxidados
na beleza do silêncio vigilante.


teci na teia dos meus sonhos
o teu corpo
de subtil espuma
inventado na confusão dos beijos
logo desfeito
           como se fosse bruma...


J.T. - 10-Maio-1973

2010-04-10

Fémina

Sonho o abismo
que transponho
no teu olhar
suave
como a chuva
a ponte
linguagem surda que tu ouves:
                                        o voo.

No sonho invento
as tuas mãos
que beijo
nas minhas mãos de nada.


J.T. - 10-ABR.-75

Epopeia

Nesta ilha
de silêncio
faço da minha voz
a quilha
que corta
esse mar imenso.

Imergido dos mitos
deste sono
secular
íntimo da indiferença
e do abismo
deste mar.

E nele esta marinha
trágica epopeia
de nautas férreos
a construir na areia
sonhos
e Impérios.

Pobres anfíbios
neste oceano
especulando
a fé
a troco de quimeras
e bancos de coral.

E as marés
sucedem-se
a medo
na geografia insular
deste silêncio
         que é degredo...

J.T. - OUT.-73

Retratos


Pasmo
na paz de pranto
à força imposta
no sono obstinado
desta gente
qual carneirada mansa
ao matadouro conduzida ...

Que venal toga esta
já puída
na busca
de parágrafos com fugas
às leis
expressas nos artigos.

Que indecorosa cátedra
e arqueológicos processos
de avaliar
inteligência a metro
no gesto obsoleto
de recitar sebentas
e tretas...

Que literatos estes
compondo ócios
em prosa e verso
e disputando
a dente
a glória
de conquistar um osso.

Que sotainas
sorrateiras
especulando a morte
na elegância
da retórica
rendoso investimento
nesta ignorância…

Políticos
venais
chupando o úbere
do tesouro
sugando-nos o sangue
esbulhando tudo
delapidando o ouro … …

J.T. - JUN-73

Misses e Mitos


No palco
o gado bamboleia
as ancas
e o nojo
na aridez das formas
poliglotas.

É medido a palmos
e o cio
dos aprumos
saboreado
no mole gosto
da língua salivando.

Em loucas cortesias
tomam-lhe o peso
ponderam-lhe o bojo
e a carne
na fraude consumada
de uma sesta.

Comparam-lhe os cascos
a implantação do ventre
as formas
de animais paridos
e duvidosos
na aridez dos tempos.

Da geografia das tetas
a litro avaliada
aprende-se o caminho
como quem tacteia
num violino
as tretas dos acordes.

O júri ocioso
tecido numa teia
mastiga bem de leve
suspira mais que nunca
e patenteia
a pequenez do cérebro.

Elege a misse
a rainha
e no mundo
a deita
durante um ano

para que fique prenhe !


J.T. - 3-MAIO-73

Terra que Habito



Pedaço desprezível de matéria
feita de mitos e de metas
por deuses e homens
bem urdidos
em incestuosos coitos
de imorais ascetas.

Pobre planeta …
Espécie de repelente bojo
onde pelas paredes
escorre o nojo
e se consome
na tela cómica de qualquer truão.


J.T. - 29-ABR.-73


Epitáfio para Pierre Ovreney (1948-1972)


















Violentaram-te
a alma
por não a teres vendido.

Trespassaram-te
o corpo
de balas.

Mas não sabem
que a verdade
não odeia
não tem medo
nem recua:

Paris inteiro
         chorou-te pela rua …


J.T. - 5-JUN.-72


Maio

No tronco
ressequido
a seiva elaborada
num fragor
brota
e rasga
o corpo que a contém.
Avança impetuosa
a tudo acode
no curso do seu rumo
renova a vida
e torna leda
ferida nova
aberta há pouco
na natureza.

É Maio que chega !

 

J.T. - 6-DEZ.-71

Fascínio

Eis o meu mundo:
Letras que jogam
e formam
palavras.
Frases que rimam,
ou não,
mas dizem
onde são fecundas.

Eis o meu mundo:
versos ao acaso
com o fascínio misturados
para uso da verdade
no domínio inseguro
do dia que desponta
no medo
que lavra …


J.T. - 6-DEZ.-71

2010-04-09

Interrogação


                                Apenas vácuo
                                onde um vagido ou grito,
                                seja em bemol ou sustenido
                                não encontra eco.

                                E neste grão
                                de lama e cisco
                                só esta náusea à minha volta
                                traz a suspeita
                                que eu existo
                                que existe vida.

                                E para lá de tudo isto !



                                            J.T. -1-JUN-70



Maio de 68


Bastões em riste
esmagam pela força
a força da razão
do povo revoltado
e triste.

Bastões em riste
opõem à miséria
a violência
e à sede de justiça
a injustiça.

Bastões em riste
correm pela cidade
dispersando a multidão
cujo rosto macilento e triste
traz marcado pelo tempo
a sede de liberdade
a que chamamam:
subversão.

Anti-Raça / 10 de Junho

ELES chamam-te
- A RAÇA …

Eu chamar-te-ei
- Desgraça
da raça
que outrora foi
nesses batéis
e barcaças
com guizos
trapos
trapaças
e outras terras conquistaram
por serem das infra-raças …

Não acredito
em chalaças
e espero
muito em breve
apesar das vossas teses
deixar na sanita
a Raça
à mistura com as fezes.


J.T.
10-JUN.-62

Razão de Ser

           
              Poesia

     A poesia, forma superior de apropriação da realidade, deve conduzir à transformação da humanidade e não apenas ao seu deleite estético. É muitas vezes na sua vulgaridade aparente que encontramos a força para superar a angústia, o desespero, a constante luta pela sobrevivência do próprio homem e da verdade, tantas vezes abafada pelo ritual da guerra.
 A Poesia é a transmutação da lama e das lágrimas em baionetas de aço que desafiam, desesperadamente, o sangue que circula nas nossas próprias veias. Ela testemunha os homens e as épocas, não vive entre paredes nem está agrilhoada a pútridas masmorras …
    A poesia é livre, denuncia e transforma-se em mensagem.
    Quotidianamente ...