O Mestre Valter Lemos (para memória futura ...)

(Para memória futura, e para que tanta malvadez e ignorância não se venham a repetir ...)


«O mal deste mundo é que os estúpidos vivem seguros de si e os sensatos cheios de dúvidas
* Bertrand Russel





1.   A entrevista do Mestre

Jornal do Fundão, 8-Fev.-2007, p. 22.

Jornal do Fundão, 8-Fev.-2007, p. 22

2.   A resposta ao Mestre

JF, 15-Fev.-2007
Como leitor assíduo do V. Jornal acabo de ler a entrevista do Secretário de Estado da Educação Dr. Valter Lemos e não pude deixar de manifestar a minha indignação perante algumas afirmações do mesmo, as quais, em minha opinião, não auguram nada de bom para o país onde vivemos.
Veja-se, por exemplo, a desqualificação que o mesmo faz dos sindicatos, nomeadamente do Sindicato de Professores da Região Centro, representativo de um elevado número de professores. Nas suas palavras, a este sindicato “Não se pode dar qualquer importância” pois é uma “organização que nunca disse nada de útil nem de construtivo sobre o sistema escolar em 30 anos de democracia”.
Toda esta entrevista é um ataque de baixo nível à vida sindical e aos profissionais do ensino, um embuste provocatório, um mero exercício de excitação e fascínio por uma espécie de subtil violência verbal, num desprezo absoluto pelos profissionais que esta organização representa.
Quando este tipo de comportamento é veiculado por um responsável político que devia ter como dever ético o diálogo e a defesa de uma classe que presta um relevante serviço público à comunidade, muitas vezes em condições assaz penosas, faz-me lembrar a velha máxima de Hermann Goering: “Quando oiço a palavra cultura, puxo da pistola”.
O que levará este personagem à demagogia e à agressão das organizações sindicais, acusando-as de culpadas do estado a que o ensino chegou, e cuja responsabilidade é, em grande parte, de quem nos governou nos últimos 30 anos …
Quanto o mesmo secretário de estado interpelado sobre a queixa feita pelos sindicatos à Organização Internacional do Trabalho por desrespeito das normas sobre a negociação, novamente puxa da pistola (em sentido figurado, é claro), para desferir mais um tiro, neste caso no próprio pé: “Isso é folclore e completamente falso, deviam envergonhar-se de dizer estas coisas …”
Dispenso-me de comentar o que é sabido pela generalidade das pessoas que acompanharam este atribulado processo negocial que nada teve de negociação e foi rejeitado pela totalidade dos sindicatos, muitos deles afectos ao próprio governo a que pertence o citado secretário de estado.
A falta de respeito pela sistema legal e pelos tribunais também não será muita, pois, declara na mesma entrevista, a propósito do pagamento como extraordinárias das aulas de substituição, as quais já tiveram decisões favoráveis aos sindicatos, que “isso não tem qualquer importância” acrescentando, “o novo estatuto já revogou essa norma”, ignorando que esse novo estatuto não tem efeitos retroactivos sobre o pagamento das aulas que estão em discussão nos tribunais.
Nada me liga ao sindicato em questão, nem sou professor da região centro, mas acho que afirmações destas são perigosas e podem prenunciar o desejo de um sindicalismo sem voz, sem opinião, domesticado e submisso sabe-se lá a que interesses …
(Jornal do Fundão, 15-Fev.-2007, p.24)
Em vez de tentar endossar sub-repticiamente a responsabilidade do fracasso das politicas educativas dos últimos 30 anos, para os professores e os seus mais representativos sindicatos, melhor seria que procurasse a montante das escolas a resolução de várias maleitas que se reflectem na escola, como a pobreza, o desemprego, a cada vez maior desigualdade de classes, a toxicodependência, a violência juvenil, a sida, a desestruturação da família, assim como exclusão social que, tanto quanto me parece, têm aumentado sob governo do qual o citado governante faz parte…
Seria curial o contraditório, nas páginas do Jornal do Fundão, pelo sindicato visado.
Audiatur et altera pars (ouça-se também a outra parte).
Assim se aprofunda a democracia.
Saudações cordiais.

 (João Trigueiros, JF, 15-Fev.-2007)


3.   A boysada em defesa do Mestre

« ... a ‘boysada', um insulto a um país cuja juventude olha o presente e o futuro com a maior aflição. São especialistas de coisa nenhuma e peritos em questões gerais: dão para o frete que for preciso em cada momento. E no momento seguinte embolsam mais uma recompensa e mudam de poleiro, prontos para outra. Estão na moda e na mó de cima. Sempre. Não são uma pecha da democracia. Já existiam antigamente. Só se apresentavam com outras fardas

A agradecida defensora do Mestre:

Jornal do Fundão,
1-Mar.-2007, p. 24



4.   Resposta à agradecida defensora do Mestre:





DESAGRADADO com a carta que li na vossa edição de 1 de Março de 2007 sob o título “Valter Lemos e os sindicatos”, gostaria de tecer algumas considerações sobre a mesma, pois esta afigura-se engajada numa estratégia de propaganda coordenada para continuar a denegrir a imagem dos professores. A citada carta poderá ser produto de uma certa ingenuidade mas, de facto, mais parece trabalho de encomenda elaborado por um qualquer serventuário do poder e, por isso mesmo, não mereça nenhuma credibilidade, o que não significa que deva ser ignorada, visto que uma mentira mil vezes repetida torna-se verdade”, como afirmou em tempos um “notável” ministro da propaganda de um uma ditadura de muito má memória, cujas técnicas também elas parecem muito de agrado da actual conjuntura.
Não me vou debruçar sobre os reiterados ataques ao mundo sindical, pois, já toda a gente minimamente informada – e bem formada – percebeu de onde parte esta insidiosa campanha orquestrada e o que pretende atingir.
Na verdade os diversos sindicatos são um pernicioso obstáculo aos vorazes interesses da globalização (e dos ingénuos ao seu serviço): o capitalismo selvagem e transnacional, e o neoliberalismo, que postulam tudo ser mercadoria e com as suas acções ameaçam o planeta ou, na melhor das hipóteses, o transformam numa gigantesca cenografia de bordel. A desigualdade social aumentou em vez de diminuir, e é aqui que está a força dos sindicatos, adaptados aos novos desafios criados e não, como se sugere, apenas a exercer politicas de reivindicação salarial.
Quem de facto faz política de merceeiro e reduz as pessoas a números contabilísticos, são aqueles que, ao serviço de interesses inconfessáveis e sob a pressão do “grupo do Beato” ignoram que os serviços de interesse público existem para servir as populações e não para gerarem lucro, como a Saúde, a Defesa, a Segurança e o Ensino, áreas estas constitucionalmente protegidas. Se deixarmos nas mãos destes senhores o nosso destino colectivo, corremos o risco de ter de abandonar os velhos porque só dão despesa, ou baixar os períodos de pós-operatório para diminuir os custos, ou ainda pagar a forças de segurança privada para protegermos o bairro que habitamos caso não queiramos ter o Bronx ao virar da esquina. As campanhas que promovem, tentam convencer-nos que eles dão o melhor para nos governar mas, de facto, os índices europeus (que ainda não conseguimos manipular) dizem-nos que cada vez estamos a ficar mais parecidos com a Roménia, a Albânia, ou o Burkina Fasso.
Devemos estar em guarda com esta gente, subproduto cultural em expansão, adoradores do “choque tecnológico” para esquecer a ruralidade original, e por isso mesmo tentando esmagar o interior e o mundo rural. Esses sim, querem acabar no interior do país com urgências, hospitais, maternidades, postos de policiais, estações do caminho-de-ferro, e escolas às centenas … Serão os sindicatos os culpados de tudo isto? Ou será que os grupos privados vão substituir-se às funções a que o Estado está obrigado constitucionalmente, numa mera lógica de lucro, tendo como consequência o nosso empobrecimento colectivo? Mas para isso vai ser preciso arrasar com o movimento sindical, e nada melhor do que começar a dar o exemplo pelos maiores sindicatos de Portugal. Ou não será assim?
Na citada carta volta a insistir-se, teimosamente, “na aberração” do pagamento das aulas de substituição … Os tribunais administrativos já deram razão a quatro casos de professores. Falta um quinto e ainda há, no mínimo, mais de cinquenta casos para julgar. Depois disso – e só nessa altura – talvez voltaremos a conversar …
Quanto à mencionada leitora que escreveu uma carta ao vosso jornal e nela manifesta a indignação de ter tido “apenas 18 euros de aumento de reforma”, que penso ser muito pequena, fá-lo com todo o direito, nomeadamente num país onde os detentores de cargos políticos tem reformas quase milionárias, apenas com alguns, poucos, anos de trabalho. Ou será que a culpa é novamente dos professores?
Saberá a autora da carta que em quase toda a Europa as aulas de substituição são pagas? Mas não me admira esta ignorância, pois ainda conheço gente que pensa que Camilo, Eça ou Junqueiro, são antigos jogadores de futebol …
O que é grave é a tentativa de fazer fumaça e acicatar os leitores contra uma classe profissional, chegando ao ponto de mencionar que “esta senhora ainda tinha de ter um aumento inferior para que o Ministério da Educação pudesse pagar as aulas de substituição como extraordinárias!!!! Surrealista”.
Surrealista – digo eu – é quem desconhece as nomeações de amigos, filhos de amigos e correligionários, na vigência de uma politica de despedimentos e de redução para metade dos funcionários do Ministério dos Negócios Estrangeiros, como foi o caso da nomeação de uma jovem de 28 anos, ex-assessora de um ministro, para assessora na embaixada de Londres com um ordenado inicial de 9.000,00 Euros/mês. Quer mais casos destes? Tenho uma mão cheia … e é só a ponta do icebergue… Quantas pensões de reformas podiam ser melhoradas se acabassem de vez com a voragem deste clientelismo?...
Para terminar, sem me alongar muito, quero dizer à citada autora ou a quem hipoteticamente lhe encomendou o serviço de novamente verberar os sindicatos, caso seja este o caso, que aconselhe os responsáveis deste país a promover politicas que façam com que as crianças vão para a escola de barriga cheia. Para isso é preciso que os pais tenham empregos minimamente remunerados, saúde, segurança, etc. Eu ainda não vi os 150.000 empregos prometidos… Talvez os culpados sejam os sindicatos que é preciso abater por não aceitarem trabalho remunerado com uma malga de arroz à semelhança da China…
Quanto aos professores que não trabalham, muitos conheço que entram ao serviço por volta das 8:00 horas da manhã com reuniões de trabalho ao fim do último tempo da tarde, saindo das escolas posteriormente às 20:00 horas da noite. São mais de 12:00 horas dentro de uma escola … nas condições que se conhecem, onde por vezes, até cadeiras faltam para estarem sentados …. E são gente que tem família, pais doentes, filhos que não têm onde ficar … Muitos deles, intimidados, chegam a fazer trabalhos que competem aos auxiliares de educação, como vigilâncias aos recreios, aos refeitórios, e são induzidos a obrigar a criancinhas a comer e a dar uma ajudinha nos tabuleiros e nos jarros da água…
Fico por aqui e, em definitivo, dou por encerrada esta polémica que nada dignifica a escola pública.
A tudo isto, os eleitores, na devida altura, saberão dar a resposta conveniente …
Séneca, que viveu um período de profundas convulsões políticas em Roma e nunca se furtou a dizer o que pensava, um dia disse: Prefiro ofender com a verdade a agradar com a lisonja.
Faço dele as minhas palavras
Saudações cordiais.

(João Trigueiros, RC, Mar-2007, pp.40, 41.)


4.   Governados por gente ensandecida ...
     (os aprendizes de Henrich Himmler)

«Aprendizes de Henrich Himmler»
Jornal do Fundão, 2-Ago.-2007
 Como cidadão venho expressar a minha veemente revolta contra a falta de escrúpulos de quem nos governa, fazendo-me sentir o maior horror, raiva e tristeza, por partilhar a cidadania com gente que permite a repetição de situações como a que acabo de tomar conhecimento através da imprensa diária.
Maria da Conceição Cruz, professora do 1.º ciclo, em Ovar, com três cancros diagnosticados - qualquer deles mais fatal do que o outro - , após uma junta médica que a considerou inapta para o trabalho, foi submetida à apreciação da Caixa Geral de Aposentações (CGA), cuja junta alterou o “sim” conferido à sua incapacidade para exercer funções (é professora e um dos cancros é na língua) e substituiu-o por um “não” … o que a obriga a voltar a apresentar-se na escola onde está colocada.
Tudo isto a acrescentar aos conhecidos casos da professora de Aveiro com leucemia e do professor de Braga com cancro na garganta, compelidos a “morrer em combate”…
Tudo isto é demasiado monstruoso para que o país não pare para pensar e, no mínimo, obrigue os responsáveis por estas trágicas situações à demissão imediata.
O servilismo primário está nitidamente a transformar a “boysada” em aprendizes de Heinrich Himmler, e o país num local perigoso para (sobre)viver…
Só falta colocar a porta da CGA o clássico letreiro «Arbeit macht Frei» (O trabalho liberta), à semelhança do que acontecia nos campos de concentração de Auschwitz-Birkenau.
Que a Prof. Maria da Conceição Cruz um dia possa perdoar aos seus algozes.
Que os Deuses tenham piedade de nós portugueses.

(João Trigueiros, JF, 2-Ago.2007)

Sem comentários:

Enviar um comentário